sobre o chão de Lisboa


[Terreiro do Paço/Praça do Comércio, Lisboa, Fevereiro 2009]


Mas os modelos mais imediatos para cidades planejadas vieram, curiosamente, dos assentamentos coloniais espanhóis e portugueses na América Latina, onde a norma era um esquema rigoroso de ruas e praças perpendiculares.

O último dia do mundo: Fúria, ruína e razão no grande terremoto de Lisboa de 1755, Nicholas Shrady, 2011



Tome-se o devido distanciamento à distância que toma um inglês ao escrever sobre Portugal: sempre com alguma condescendência, que a todo o momento torna implícita a razão da simples existência e improvável sobrevivência de Portugal mercê de especiais favores ingleses. Aparte isto, note-se em Fúria, Ruína e Razão o detalhe e vivacidade das muitas pequenas estórias que teceram a grande História. Do drama da tragédia às intrigas da corte; da guerra aberta Carvalho e Melo vs. Jesuítas, sobre o domínio da razão da destruição e construção, ao vigor de um Manuel da Maia aos 78 anos a lançar Lisboa moderna cumprindo o projecto político de Pombal; das repercussões nas cortes, salões e círculos iluministas europeus às insidiosas manobras pela configuração de uma coroa absoluta. E o centro do texto: mal natural vs mal moral.
Embora o panorama genérico da sociedade e cultura portuguesas seja equivocado, porque lido numa grelha anglo-saxónica impossibilitada de compreensão do pessoalismo ibérico (cf. Raízes do Brasil, Sérgio Buarque de Holanda), o pormenor é vívido e esclarecedor. Mas entre Voltaire e Malagrida, contudo, não é necessário mais, hoje, tomar partido. Muito menos o do fastidioso politicamente correcto.